Hélverton Baiano
O branco e a branquidão requerem a ausência do claro e o negro só prolifera onde há muita claridade, muita brancura. O claro foi feito para o escurecer e o escuro para viver no claro. Este pensamento resumia a teoria que Mourisço Sembereba, um negro-aço muito popular em Saracutópolis, vivia a desfrutar na boca da rua, cantando loas e arrotando preguiça, arrulhando espaços no coração indulgente das nossas gentes.
Na última eleição de outubro, ele se dizia o Barack Obama de lá e passou a se pintar com carvão para fazer comícios fictícios com palavrórios enfeitados e lordes, decorados de discursos que ouvira da coleção de Seo Zinza Toco, que tinha a mania de colecionar bugigangas desse naipe. Com uns trololós bem construídos e um banquinho de feira, Mourisço Sembereba criou eleitorado entre os iguais e outros mais que gostavam de ver o circo pegar fogo. Tanto que, mesmo sem registro ou coisa que o valha, conseguiu mais de 500 votos num eleitorado de 7 mil votantes. Pois num é Saracutópolis hoje uma cidade crescida e aparecida?
Abria seus discursos com uma saudação aos buracos brancos da pernosférica ozônica esculapatória sideral que, segundo dizia, eram mãe e pai da nossa existência, onde o Capeta, um branquelo esquisito, fez sua morada, mas também de onde Deus, um negro retinto, o expulsou para o buraco negro. Daí porque doravante só vivia pintado a carvão, confirmando sua teoria de que o céu era claro e por isso Deus era preto, o inferno era escuro e por via disso o Capeta era branco.
Não dizia muito o porquê, mas ele considerava o leite filho do Cão e o café, filho de Deus, e ambos eram apreciados. Mesmo passada a eleição, vivia difundindo em comícios temporões essas leréias apegadas ao senso incomum e grudado nisso galvanizou a teoria do buraco branco, que dizia tinha base no esfriamento global e em contraposição à do buraco negro. Carregava no entanto alguma astúcia sua ingerência social e, atado aos mais de 500 votos, deu logo de criar uma igreja, que besta lá sou eu.
Fundou a igreja dos Santos Infernos, instalada numa tapera velha que tinha na ponta da rua. Dedicou-a aos santos e capetas, onde os santos eram pretos e ficavam no claro e os capetas eram os brancos e ficavam na parte escura do templo. Todo dia, acendia uma vela pra Deus e outra para o Diabo e convidava os fiéis para um culto. Há pouco sumiu por uns dias e voltou anteontem falando que fora para a posse do Barack Obama e lá, no meio da multidão, teve uma visão de que deveria erguer um altar para São Barack, o primeiro santo de sua igreja. No começo, apenas uns dez escorraçados penitentes paravam ali para ouvir suas pregações e deixavam pequenas contribuições dizimais. Logo, Mourisço Sembereba adquiriu uma bela casa no centro da cidade, pintou-a metade preta e metade branca, colocou na fachada "Igreja dos Santos Infernos" e prospera hoje com mais de 100 fiéis.
(Colaboração do correntinense Hélverton Baiano)
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